Medida Provisória: a estreia de Lázaro Ramos na direção é emocionante
O que pode ser mais cruel do que uma medida em que, deliberadamente, decide retirar todos os negros do Brasil e os “devolverem” para o seu lugar de origem? Essa é a história de Medida Provisória, filme nacional que estreia dia 14 de abril nos cinemas e esperamos que gere muito debate.
Lázaro Ramos juntou um elenco de peso e debutou no cinema com um filme que mexe com o espectador. Afinal, no alto de todos os meus privilégios, não sei o que é sofrer racismo. Não sei o que é alguém trocar de calçada quando me vê. Não sei o que é algum vizinho não querer pegar o elevador comigo. Sou uma jovem, branca, de classe média, que nunca vai saber o que é viver a violência de ser preterida por causa da cor da minha pele. Mas Medida Provisória me fez chorar.
Inspirado na peça teatral Namíbia, Não!, de Aldri Anunciação, Medida Provisória imagina um Brasil em que uma determinação do governo decide que todos os afrobrasileiros, ou pessoas de melanina acentuada, como eles chamam no longa, devem “voltar ao seu país de origem”. Uma falsa retratação racista, afinal, é um trabalho de embranquecimento da população.
Contudo, a medida começa sutil. Primeiro, é uma oferta, como se fosse um presente. Depois, vira determinação. Aí começam cenas de violência que, infelizmente, são mais reais que a gente gostaria de imaginar. Gostaríamos que tudo fosse fruto da sétima arte. Mas não é.
Em determinado momento, o personagem André, de Seu Jorge comenta “como foi que deixamos chegar nesse ponto? Como a gente riu disso?”. Essa fala é muito emblemática para tudo o que acontece no Brasil desde 2018. Quando o Pânico na TV e o SuperPop catapultaram Jair Bolsonaro para a fama, aquilo parecia apenas uma piada de péssimo gosto. E aí o pior presidente da história desse país foi eleito, sem ninguém com consciência política entender exatamente o que aconteceu.
Assim como Bacurau, Medida Provisória imagina um futuro distópico, mas nem tão distópico no Brasil de 2022. O extermínio da população preta, os ataques racistas, o escanteamento da população periférica. Tudo isso vem tomando uma nação que, a cada dia que passa, põe seus preconceitos ainda mais visíveis. Enquanto comunicadores perguntam se “ter uma opinião racista é crime?”, um homem negro vai fazer compras em um supermercado e é agredido até a morte. Como falamos em A Jaula, o país que tanto reza não entendeu nada sobre o discurso de amor ao próximo.
Além de uma história reflexiva e muito potente, o elenco é repleto de atores excelentes. Taís Araujo, que vive Capitu, Seu Jorge, que já mencionamos e Alfred Enoch (de Harry Potter), protagonizam o filme. E ganham companhia da sempre ótima Adriana Esteves. Renata Sorrah vive uma detestável vizinha racista. Outros nomes importantes fazem participações, como Emicida e Luís Miranda.
A estreia de Lázaro Ramos nas telonas não podiam ser mais feliz. Um filme que deveria ser assistidos por todos os brasileiros. Vá ao cinema e saia refletindo sobre todos os seus privilégios.