CríticaFestival de CinemaFilmes

Bacurau é a crueza do Brasil em um futuro nem tão distópico assim | Crítica

Para abrir o 47º Festival de Cinema de Gramado, o filme escolhido foi o aclamado Bacurau, de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. Destaque em Cannes, Bacurau é uma ode ao cinema brasileiro.

Trazendo a narrativa que se passaria alguns anos além de 2019, em uma região que está esquecida no sertão e que, literalmente, saiu do mapa, vive a população de Bacurau, localizado em algum lugar não identificado da caatinga. Por diversos motivos, principalmente, políticos, o povo tem o acesso à subsídios básicos para a sobrevivência precarizados. Apesar de todos os males, a localidade usa a sua brasilidade para se unir e enfrentar, do seu jeito, tudo o que já aconteceu e o que ainda pode acontecer.

Sônia Braga de um jeito que não estamos acostumados…

Desta vez, temos Sônia Braga nada vaidosa ou sexualizada. Temos uma médica que tenta fazer o que pode para a localidade, mas é tão humana quanto qualquer um de nós. Ao lado de Pacote (Thomas Aquino) e Lunga (Silvero Pereira), ela luta contra coisas estranhas que começam a acontecer na cidade. Aí entra um pouco de gore, trazido por norte-americanos que parecem jogar um jogo sinistro, chefiados pelo alemão Michael (Udo Kier).

Bacurau trata de um futuro distópico que deixa o espectador com vergonha. Afinal, somos impactados com uma situação de extrema falta de suprimentos básicos misturados com drones e alta tecnologia. E, logo de cara, vemos que o filme não é aquilo que achávamos ser.

A fotografia do sertão, com um verde que permeia toda a região, com objetos culturais fortes em tons terrosos, casas coloridas e o barro vermelho fazem uma composição muito bonita e agradável aos olhos, ambientando o espectador. Além disso, temos uma trilha sonora, combinada com o visual, que consegue modernizar, sem perder o encanto.

Contudo, não são os adjetivos técnicos, muito bem construídos, que importam em Bacurau. O que importa mesmo são as metáforas sociais do nosso Brasil. Com papéis distintos e marcantes, temos cenários e pessoas que podem caber, salvas devidas proporções, a todos os locais de nosso país. A velha política masculina, branca e de meia-idade está presente em Bacurau. A política que acha que dar alimentos vencidos e lista telefônica no lugar de livros escolares é fazer “assistencialismo”. Se em alguns países as cenas da cidade que se esconde do prefeito foram engraçadas, no Brasil, elas são tristes. Porque a nossa realidade é muito triste neste aspecto.

Em Bacurau, a escola e o museu se tornam locais de resistência. Afinal, é a ele que a população recorre quando precisa. O lugar da educação e o lugar das memórias, que caminham junto e tratam de dois assuntos que devemos refletir e preservar: o passado e o futuro. E traz um outro questionamento: será que damos importância devida à nossa história?

Deixar o espectador se questionando é um dos prazeres preferidos do diretor, afinal, é impossível sair da sala de cinema depois de assistir Bacurau sem querer repassar o passado, o presente e, principalmente, o futuro. O quanto fazemos pela nossa comunidade? O quanto estamos unidos com os nossos para que a engrenagem continue girando? O quanto desprezamos a nossa brasilidade? O quanto enaltecemos a cultura estrangeira em detrimento da nossa? O quanto acreditamos em promessas pífias? Como diria a frase final do filme, “Este é só o começo”. E que estejamos preparados para o que vem pela frente e que sejamos fortes e unidos para enfrentar, haja o que houver. Assista Bacurau e se transforme.

Veredito da Vigilia

Foto: Cleiton Thiele/Agência Pressphoto

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *