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Belfast: Kenneth Branagh tem um “Roma” para chamar de seu

O que falar de Kenneth Branagh? Para os fãs de Harry Potter ele é o professor Gilderoy Lockhart, para os fãs de Agatha Christie ele é o detetive Hercule Poirot. Mas o ator, diretor e roteirista norte-irlandês também é conhecido por suas várias adaptações de peças de Shakespeare para o cinema. Sendo sua primeira em 1989 com Henrique V. Com o prestígio que conquistam ao longo dos anos, alguns realizadores conseguem “carta branca” para fazer filmes mais pessoais. Dando dois exemplos, temos John Boorman com Esperança e Glória (1987) e Alfonso Cuarón com Roma (2018). Agora, chega a vez de Kenneth Branagh com Belfast.

O longa se passa em 1969 na cidade de Belfast na Irlanda e narra, pelo ponto de vista de Buddy um dos episódios mais cruéis e violentos da história do país: o conflito entre protestantes e católicos conhecido como “The Troubles”. Buddy é interpretado pelo estreante Jude Hill, um garoto de oito anos (um análogo ao diretor) que, entre uma brincadeira e outra, acompanha o aumento dessa tensão étnica-política-religiosa e os problemas que acabam afetando sua família, composta pelos pais interpretados por Jamie Dornan (trilogia Cinquenta Tons) e Caitriona Balfe (Ford Vs. Ferrari) e os avós Ciáran Hinds (Game of Thrones) e Judi Dench (Assassinato no Expresso Oriente). Curiosamente seus nomes não são mencionados, somente são Pai, Mãe, Vô e Vó.

Jude Hill brilha como Buddy Belfast
Jude Hill brilha como Buddy

Tudo é visto pelo olhar de Buddy, e os ângulos utilizados por Branagh ajudam a ilustrar isso. A câmera na sua grande maioria das vezes, está quieta sempre nos cantos, em algum momento a figura paterna é vista de baixo para cima, em contra-plongee como se fosse grandioso, até mesmo um super-herói. Um dos destaques vai para a cena inicial com a câmera girando em seu rosto desfocando o segundo plano, passando a mensagem de não entender o que está se passando. Realmente, uma aula de composição de cena! A fotografia em branco e preto de Haris Zambarloukos (parceiro de Branagh desde “Um jogo de Vida ou Morte” de 2007) é belíssima. Com alguns trechos em cores como a transição de presente e passado e momentos inesquecíveis para o garoto como ir ao cinema pela primeira vez. As canções de Van Morrison prestam uma grande homenagem a todas as pessoas que viveram esse período.

Kenneth Branagh homenageia seu amor pela sétima arte

O longa é bem dirigido, bem escalado e a parte técnica é primorosa, mas o peso maior aqui é o roteiro. Nesse caso, um peso para o outro lado da balança. Não existe calor humano, tudo soa vazio e mesmo que o conflito não seja aprofundado – é visto por uma criança – ele acaba não tendo um peso dramático necessário para que o telespectador se identifique com os personagens.

Comparar Belfast com o recente Roma (2018) de Alfonso Cuarón é quase impossível. Tanto pela narrativa com as memórias de infância e a retratação dos acontecimentos violentos históricos de ambos (em Belfast: os Troubles, em Roma, o massacre de Corpus Christi) até a fotografia em branco e preto. Mas Roma é mais caloroso e com senso de urgência.

Intolerância religiosa em Belfast de 1969

Ao final, Belfast é como aquele áudio de “whatsapp” de cinco minutos que você recebe de seu amigo contando uma história muito bonita, em que ele passou por um período conturbado, mas tem uma memória afetiva que fez dele um ser humano melhor. Você até gosta da história, mas só responde com um “ok.”

Curiosidade:

No Oscar 2022 que ocorrerá dia 27 de março, Kenneth Branagh já quebrou um recorde ao receber sete indicações em sete categorias diferentes ao longo de sua carreira, mas ainda não levou nenhuma estatueta para casa e seu filme Belfast concorre em sete categorias incluindo melhor filme.

Veredito da Vigilia

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