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Roma, Cinema sem Cinema | Crítica

Badalado por sua vitória no Festival de Veneza e uma consequente onda de boa repercussão entre a crítica especializada, o longa Roma, de Alfonso Cuarón (vencedor de sete Oscar por Gravidade, de 2013), estreou na sexta-feira, dia 14, de dezembro na Netflix. Ao alcance dos controles remotos de todo o mundo, Roma é cinema sem cinema. Todo rodado em 70 mm, em preto e branco, sem preocupações com as amarras hollywoodianas, ele certamente não terá todo o impacto que teria em uma sala escura, com tela grande, e som igualmente envolvente. Uma pena, principalmente para quem gosta de cinema e todos seus rituais. Ao mesmo tempo, é uma forma democrática (e mercadológica) de distribuir o que já foi cinema, dando o acesso a qualquer assinante (eram 125 milhões em todo o mundo até abril de 2018). Mas será que toda a preocupação e dedicação de Cuarón ao fazer um dos mais belos filmes do ano terá motivação nas residências mundo a fora? A minha parte vou fazer aqui, nas próximas linhas.

Alfonso Cuarón e a protagonista Yalitza Aparicio

Embora sem o impacto da sala grande, Alfonso Cuarón traz um drama que se passa no México, retratando ao mesmo tempo as mudanças em uma família, em sua casa, e também no próprio país. A escolha e liberdade nos joga para uma produção totalmente diferente dos blockbusters de Gravidade e Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban (ok, esse último um comparativo bem injusto, ainda que seja o melhor filme da franquia). Contando a história com calma, vemos Cleo (Yalitza Aparicio), a empregada de uma família abastada, em diversas situações. E todas elas com o impacto de sua realidade particular, a realidade da família e a da sociedade em que vivem.

Em uma crônica lenta, Cuarón vai mostrando as peculiaridades do México nos anos 70 e a derrocada de todos os envolvidos nela. Todos passam de momentos tranquilos para situações turbulentas em pouco tempo. Os contornos da vida real cercam a todos: a empregada que engravida e fica sem saber o que fazer, a mãe que perde o marido e principal provedor da casa (lembrando que é anos 70, ok?) e mesmo assim leva a família nas costas, e as economias que vão alterando alguns comportamentos e padrões. Roma (o bairro onde se passa o filme) coloca no centro das atenções a força das mulheres e o mundo que elas precisam erguer para tocar a vida. Seja com um filho, ou mesmo quatro. Os homens por sua vez, pouca voz têm por aqui. Na verdade, assim como na vida real e diferentes núcleos sociais, eles fazem a narrativa girar pelas suas faltas, de ação, ou mesmo, noção. Quem lhe dirá o personagem Fermín (Jorge Antonio Guerrero).

 

Embora uma das marcas registradas de Roma seja exatamente a paciência para compor toda a história, vemos momentos bem marcantes, e que até certo ponto, tiram o minimalismo nas composições de cenas. Principalmente quando temos: um grande incêndio, uma grande revolta e tumulto social (todo acompanhando de dentro de uma loja de departamentos) e a cena do nascimento de uma criança. São momentos de intensidade, que, infelizmente, acabam novamente perdendo o impacto, por maior que seja sua televisão. Por favor, nem tente olhar em um celular. O filme não merece isso.

Por toda a dualidade envolvendo o filme e o “estúdio Netflix”, Roma é um grande acerto enquanto história, mas não como produto cinematográfico. Apenas na China (por motivos de “não tem Netflix”) ele ganhará o circuito como deveria ser. Fica a dúvida se o longa será injustiçado também pelos 125 milhões de logins do serviço de streaming. Mas a minha parte eu fiz. Assista, na maior tela possível.

Veredito da Vigilia

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