CríticaFestival de CinemaFilmesOpinião

Todos os mortos | Crítica

O segundo longa brasileiro da 48ª edição do Festival de Cinema de Gramado foi o paulistano Todos os Mortos, dos diretores Caetano Gotardo e Marco Dutra. Com uma (boa) ideia na cabeça e as câmeras na mão, eles entregam um filme de época que se mistura ao presente, apontando o quanto da história do Brasil ainda impacta negativamente na nossa sociedade nos dias de hoje. Mas para isso, eles seguem uma receita pouco conveniente quando se pensa em um filme de época. E essa fórmula rara poderia ter se saído melhor com um pouco mais de recursos técnicos e de produção. 

O foco do filme inicia com a família Soares e suas mulheres. Antes agarrados em privilégios, agora passam a sentir o “desconforto” que é ficar sem a principal empregada da casa. Perceba que as aspas colocadas em desconforto pode ser traduzido em: as abastadas não sabiam sequer passar o café. Nesse núcleo vemos Maria (Clarissa Kiste) uma filha devota a religião católica, sendo freira e professora em um convento, a matriarca Isabel (Thaia Perez), já com uma idade muito avançada, e a filha mais nova Ana (Carolina Bianchi) musicalmente talentosa, mas que guarda alguns segredos que passam entre ver espíritos de escravos mortos pela casa e esconder alguns segredos para a família. De outro lado, temos o núcleo da ex-escrava Iná (Mawusi Tulani), que trabalhava com essas mulheres ricas e agora luta para reagrupar sua família, diluída em várias cidades em função da realidade social.

Em Todos os Mortos vemos a derrocada da família rica, que vai se desfazendo de seus bens para manter as aparências ao mesmo tempo que temos o progresso do Brasil, que vai liberando escravos e construindo novos meios de transporte. Os marcos históricos do filme nos colocam em datas “celebradas” da história nacional. Esse pano de fundo é um recurso bem utilizado, mas o longa não esconde seus pecados principais que são basear toda a narrativa com câmeras quase estáticas que impossibilitam recortes fluídos, além de locações que geram um incômodo ao misturar os anos de 1899 e os dias atuais, por mais propositais que possam ser. 

Todos os Mortos: Carolina Bianchi, Thaia Perez e Clarissa Kiste em cena

E é nessa (falta de) fluidez que o longa acaba perdendo o espectador. E isso acaba sendo percebido tanto nos diálogos entre os personagens quanto na edição e transição das cenas, que resultaram em uma trama pouco orgânica. A própria recriação daquela época pode soar incômoda, e fica perceptível a jogada de usar poucos cenários abertos ou panorâmicas para que possamos acreditar que realmente estamos revivendo aquele período do tempo.

A crítica trazida por Todos os Mortos é sua alma. É nela que o filme cresce. Embora seja todo traduzido em um produto final de difícil digestão, é a boa ideia que poderia ser melhor lapidada, seja sendo mais expositiva, ou ainda flertando de forma mais clara com o sobrenatural e as ricas metáforas que isso poderia trazer quando se explora temas como o passado (triste) e o presente (igualmente triste) do Brasil.

Veredito da Vigilia

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *