CríticaFilmesOpinião

I Wanna Dance With Somebody: Whitney Houston em todas as sua facetas

Cinebiografia de uma das maiores vozes de todos os tempos, “I Wanna Dance With Somebody: A História de Whitney Houston” chega aos cinemas nesta quinta-feira (12/01)

Da garota do coral de Nova Jersey a uma das recordistas e mais premiadas artistas de todos tempos, o longa “I Wanna Dance With Somebody: A História de Whitney Houston” (título auto-explicativo) leva o público a uma jornada emocionante pela vida e carreira de Whitney Houston, com performances arrebatadoras e uma trilha composta pelos hits mais amados da diva. Spoiler da vida, Whitney foi encontrada morta na banheira de um hotel em fevereiro de 2012.

O longa contou com escolhas muito intencionais, na frente e por trás das câmeras. O roteirista é Anthony McCarten, também responsável pela também cinebiografia Bohemian Rhapsody (2018) e outros trabalhos como A Teoria de Tudo (2014) e Dois Papas (2019). Na direção temos a indicada ao Oscar Kasi Lemmons, atriz e diretora conhecida por encabeçar projetos de protagonismo negro. Na produção, entre outros nomes, temos Clive Davis, produtor musical que “descobriu” e acompanhou Whitney por toda a sua carreira. E como protagonista (e também produtora) temos Naomie Ackie, produtora, cantora e atriz ganhadora do BAFTA.

No filme, Naomi somente dubla gravações de Whitney, porém, no set de gravação, cantava de verdade para trazer mais realismo para a sua atuação. Carinho e cuidado nos mínimos detalhes. Falando nisso, o longa também contou com pessoas próximas de Whitney como consultoras. Além de Clive, que também era amigo pessoal de Whitney, o irmão da cantora, Gary, e sua cunhada, Pat, participaram do processo de construção da obra.

Ao contrário de outras cinebiografias e, consequentemente, histórias reais de artistas que vieram completamente do nada e lutaram arduamente por seu espaço na indústria fonográfica, as oportunidades vieram facilmente para Whitney. Uma “nepo baby”, termo tão utilizado ultimamente e amplamente explorado em matéria comentada no mundo inteiro, da New York Magazine/Vulture, a artista é filha de artista, afilhada de artista, sobrinha de artista. Mas, ao contrário de tantos outros meio-talentos, o seu caso como uma “bebê do nepotismo” mal precisa ser levado em consideração, pois a sua voz já (literalmente) fala por si só. 

Intitulada “A Voz”, Whitney foi icônica em todas as suas escolhas, em toda a sua carreira, do lado bom ao lado ruim. E o filme retrata tudo isso com muita qualidade. Com caracterizações excelentes, recriou diversos momentos marcantes na vida da atriz. Clipes, apresentações, tudo feito de forma muito fiel, com ótimos figurinos. Um filme que vale ser assistido nas telonas, para aproveitar com o melhor som todo o alcance musical da artista.

Naomie Ackie é Whitney Houston em I Wanna Dance With Somebody
Naomie Ackie é Whitney Houston em I Wanna Dance With Somebody

A escolha do nome não é à toa. O significado por trás da própria escolha de Whitney, que recebia demos de compositores, para escolher as canções que gravaria, já traz a carga e a mensagem a que o filme se propõe. “I Wanna Dance With Somebody” é uma música dançante, divertida, mas que de acordo com Whitney, como retratado no longa, se trata de uma história de alguém que quer muito dançar com alguém (e amar alguém), mas que, por algum motivo, não pode. História da vida de Whitney, infelizmente.

Em sua carreira, a cantora precisou se tornar um símbolo, ser uma princesa. Abdicou de seu estilo e do seu coração para se tornar o que a sua família (e o mundo) queria que ela fosse. Virou a queridinha da América, a primeira cantora negra a ganhar verdadeiramente o coração de todos os brancos, evoluiu a sua música para agradar também ao público negro, que não a via verdadeiramente como uma mulher negra. E é nessa carga toda que o longa ganha poder. É esse debate que ele traz à mesa, sobre esse constante autocorrompimento que tantos acabam fazendo (muitas vezes verdadeiramente precisando fazer) e que, infelizmente, diversas pessoas LGBTQIA+ tiveram que fazer ao longo das décadas. E foi o que Whitney teve que fazer logo nos primeiros anos, ao terminar com sua namorada Robyn.

Muitos morreram sem ter a oportunidade de ser quem realmente gostariam de ser, como Whitney. Muitos morreram criticados por serem quem eram, como Freddie Mercury. Até que ponto vale sucesso, dinheiro e fama em troca de uma alma? E por que sonhos precisam ser destruídos em detrimento de outros? Pode parecer uma reflexão exagerada, mas foi o que “I Wanna Dance With Somebody” me despertou. 

Um filme triste, de certa forma, que mais uma vez nos mostra o lado ruim da fama e do sucesso. Assim como casos tão falados de Michael Jackson e Britney Spears, por exemplo, Whitney também sofreu com pais ambiciosos demais, que tomaram para si parte de sua carreira, lhe roubando dinheiro e dignidade. Isso nos mostra que muitos precisam de apoio, suporte, mas, mais do que isso, precisamos conhecer nossa própria força e batalhar/defender os nossos ideais, nossos sonhos. 

Entretanto, por mais que traga toda essa carga e reflexões, cinematograficamente falando, o drama não pesou tanto quanto, talvez, deveria. Momentos dramáticos e derradeiros da carreira da artista foram medianamente explorados. O relacionamento abusivo com o ex-marido Bobbie Brown (interpretado por Ashton Sanders), por exemplo, por mais negativo que tenha sido mostrado, contou somente uma parte da história do casal, que na vida real envolveu também violência doméstica. 

Por mais desconfortável que seja assistir (mesmo que num produto audiovisual) um homem agredindo uma mulher, é uma oportunidade que deve ser explorada, tanto para expor de forma bruta a crueldade de um artista famoso como Bobbie Brown, como para servir de sinal de alerta para tantas situações reais. Era a chance de nos créditos finais, após as comparações com a vida real da artista, deixar uma mensagem sobre a importância de sim “meter a colher” em relacionamentos tóxicos e agressivos e incentivar pessoas que precisem de ajuda a buscar socorro.

Outros diversos fatores importantes sobre a carreira da artista também foram minimizados, como o período final de sua vida (e carreira), em que Whitney, além da luta contra as drogas, continuou desbravando o mundo da música e fazendo sim muito sucesso. Mas isso não chega a ser um problema, pois foram quase 30 anos de carreira que só caberiam em um determinado tempo de tela – e o longa já finalizou com 2h24 de duração.

Stanley Tucci como Clive Davis, produtor de Whitney Houston, em I Wanna Dance With Somebody
Stanley Tucci como Clive Davis, produtor de Whitney Houston, em I Wanna Dance With Somebody

Um ponto positivo é sempre Stanley Tucci, o homem do momento. Mais popular do que nunca na internet, Stanley faz no longa o que faz de melhor: ser o apoio que todos amamos. Mesmo sendo um ótimo protagonista (ou co-protagonista, como no caso da maravilhosa e recente minissérie “Inside Man”, da Netflix, com David Tennant), acredito que Stanley brilhe mesmo é como o coadjuvante que preenche todas e quaisquer cenas com seu carisma e boa atuação. 

Já Naomie Ackie entregou uma atuação intensa e muito convincente, nos mostrando as diversas facetas de uma personalidade tão aclamada pelo público. Entre ser (e tentar ser) a filhinha do papai, o sucesso da mamãe, a namorada apaixonada, a artista premiada, a mãe dedicada, a atriz internacional… Naomie trouxe com intensidade tudo que Whitney de fato foi. Mas, para além de todos esses papeis que a própria cantora foi, Naomie também trouxe a dualidade principal da vida de sua personagem: entre a pessoa que Whitney Elizabeth Houston verdadeiramente era e a pessoa que ela precisava ser.

I Wanna Dance With Somebody: A História de Whitney Houston não é um filme que marcará para sempre o gênero das cinebiografias, mas conta com uma ótima escolha musical (ok, em se tratando de Whitney, não é difícil). E mais do que isso, também é uma oportunidade para conhecermos um pouco mais sobre a história de uma grande artista, que marcou gerações.

Veredito da Vigilia

LEIA TAMBÉM

Globo de Ouro 2023: Confira os vencedores!

Beau is Afraid: Ari Aster coloca Joaquin Phoenix em uma jornada geracional

Todo dia a Mesma Noite: série da Netflix dramatiza o incêndio da Boate Kiss

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *