Blonde: um filme de terror do início ao fim
Você talvez nunca tenha pensado em assistir a um filme de terror com Marilyn Monroe, não é mesmo? Pois em Blonde, longa que chega ao catálogo da Netflix no dia 28 de setembro, esse devaneio se materializa. Como já falamos na nossa lista especial, você não deve levar Blonde como uma cinebiografia de Norma Jane/Marilyn Monroe. É um filme ficcional, tal qual o livro que baseia o longa, escrito por Joyce Carol Oates. Envolto nessa polêmica que é mesclar realidade e ficção, a obra nos entrega um longa pesado, longo, e por muitas vezes, difícil de assistir. Logo de cara é preciso deixar isso claro: NÃO ASSISTA Blonde se você estiver em um dia ruim ou com seu emocional abalado. A única luz que você terá durante as 2 horas e 46 minutos de duração será o sorriso de Ana de Armas, que realmente, está em seu melhor.
Depois de assistir ao filme, fiquei seriamente me perguntando para onde ele tinha me levado. Se tinha alguma mensagem, ou se foi feito puramente para chocar. Confesso que a conclusão mais próxima que tive até agora foi a desta última condição. O diretor Andrew Dominik não me transportou para um lugar seguro, acolhedor, ou que eu queira voltar. Imagino que ninguém queira. Desde o primeiro segundo de tela somos jogados a uma espiral de tragédias, mas, acima de tudo, ilusão e uma completa exploração de uma criança, de uma adolescente, e depois, de uma mulher.
Talvez aqui habite a principal crítica ou mensagem de Blonde. Marilyn Monroe, segue sendo um ícone da cultura pop absurdamente explorado. Assim o foi durante sua vida, e assim continua sendo depois dela. É essa discussão que podemos levar adiante, já que Hollywood, provavelmente o ambiente mais tóxico para mulheres (desde sempre), somente nos últimos anos conseguiu mover algumas peças importantes no tabuleiro para mudar esse jogo. Serei otimista e tentarei levar essa estigma adiante.
Apesar de entregar um produto de primeira qualidade em seus aspectos técnicos (luz, fotografia, figurinos, atuações, trilha sonora e pitadas de realidade), Blonde é uma eterna angústia. E ela só alivia quando sobem os créditos. Ana de Armas (007, Águas Profundas) é uma protagonista incrível e passou por uma verdadeira prova de fogo. São muitas cenas duras, cruéis e exploratórias em que ela se arriscou. Algo que se assemelha muito ao que Jennifer Connely passou durante Réquiem Para Um Sonho. Ana, coloque em sua mente, depois de Blonde, você não precisa provar mais nada pra ninguém.
Mas além de explorar a sexualidade ao extremo, o longa se ampara a todo o momento na relação entre pai e filha. Que na verdade, é algo que nunca existiu. Um sonho que nossa protagonista insiste em acreditar. Algo como uma ilusão de que um dia uma figura chegará para resgatá-la. Para salvar de todas as coisas ruins que a cercam e lhe colocar em um espaço seguro. E isso está também sempre espelhado em seus relacionamentos amorosos. Ela insiste em chamar todos seus amantes de “Papai”, o que deixa tudo ainda mais sinistro.
E a exploração de Norma Jane/Marilyn Monroe se apega em todas as áreas. Além do pai, temos momentos tristes com sua mãe também. E assim como no parágrafo anterior, essa relação se espelha nas suas constantes e frustradas possibilidades de ser também, uma mãe. Aqui um adendo importante. O diretor abusa de nossa boa vontade e estômago, colocando situações chocantes entre Marilyn e seu íntimo, seu corpo, e até mesmo órgãos, dando ares surreais à trama. Dominik faz questão de deixar tudo ainda mais desconfortável com cenas envolvendo fetos. Os requintes são realmente de crueldade.
Todo esse combo nos apresenta um verdadeiro filme de terror. Horror. E como sabemos, o pior filme de terror é aquele que, além de apresentar pitadas de realidade, é aquele que nos deixa a impressão que o pior é estar vivo. E nesse quesito, talvez esteja a pior e maior falha de Blonde. Ao final – e tão somente ao final dos créditos – é que temos um aviso de gatilho e indicando o site de Recursos da Netflix com informações e indicações de ajuda (wannatalkaboutit.com/br). Ele deveria estar na introdução de Blonde e em letras garrafais.
Boa sorte se for arriscar!