Legalize Já – Amizade nunca morre | Crítica
Mais um filme nacional surpreendente pra conta de 2018. Estou falando de Legalize Já – Amizade Nunca Morre, longa que dramatiza a origem da banda Planet Hemp, que fez parte de uma das últimas cenas marcantes do rock/punk/rap nacional. Talvez a última, porque realmente não lembro de uma retomada dos gêneros no Brasil depois da década de 90. O que realmente é uma pena. Mas, lamúrias de um roqueiro de lado, vamos ao que interessa. O filme dirigido por Johnny Araujo e Gustavo Bonafé consegue ser atual, pop, musical e interessante do início ao fim. E por contar uma história recente, muita gente vai recordar uma época que passou voando. Ao mesmo tempo que é divertido, o filme tem realmente o que contar, mostrando o quanto uma pessoa pode mudar a nossa vida para sempre.
Por se tratar da origem de uma banda bem controversa para a época – os membros do Planet Hemp chegaram a ser presos e cancelar shows acusados de apologia às drogas -, a trilha sonora, é claro, é um dos destaques. E mesmo que se proponha a contar como Marcelo (Marcelo D2, muito bem personificado pelo ator Renato Góes) e Skunk (também muito bem com Ícaro Silva) se conheceram, não vemos um filme piegas, onde temos os protagonistas como grandes heróis. Pelo contrário. Esse acerto é marcante e tira uma carga negativa que normalmente é vista em algumas cinebiografias nacionais. A ambientação dos anos 90 e o tom sépia em quase todo o tempo nos faz voltar no tempo e dar muitas risadas do absurdo de como coisas tão simples evoluíram tão rapidamente.
Desde cedo vemos a dupla vivendo à margem da sociedade carioca. No concreto e no asfalto, sem praia e grandes cenários. Preconceito com pobres, negros e aqueles pontos de vistas retrógrados que a pouco tempo atrás habitavam o nosso dia a dia (ou será que ainda habitam cada vez mais?). Skunk, o talentoso rapper, que se dedicava a música o tempo todo. Marcelo, um camelô com disposição para poeta e compositor, mas que não sabia muito o que queria da vida. Nesses entrelaçados também surgem Sonia (Marina Provenzano, a protagonista de Mormaço) a namorada de Marcelo (ainda não era D2) e Brennand (Ernesto Alterio, que também pode ser visto na série As telefonistas), como coadjuvantes importantes, além de Stepan Nercessian (como pai de Marcelo).
Em várias brincadeiras de roteiro, vemos piadas com músicas e artistas, e um paralelo muito latente, que sempre dividiu roqueiros de pagodeiros. E isso tempera muito bem a receita do filme. Enquanto havia uma cena musical preocupada com o contexto político do país, tinha outra um tanto quanto aquém disso. E quando Marcelo está na pior ou se ‘rendendo ao sistema’, é um axé ou um pagode chiclete dos anos 90 que surge ao fundo. Uma quase metáfora do inferno, eu diria (na época, agora todo mundo canta É o Tchan, com orgulho). Além da música e a “pauta” que sempre catapultou o Planet Hemp, dá pra perceber a mistura de muitos toques políticos e temas como aborto e violência por parte da polícia. Tudo aparece representado de alguma forma, seja na poesia das letras, ou mesmo no impacto da vida do subúrbio carioca. E claro, a ‘erva natural que não pode te prejudicar’ está lá… quase o tempo todo.
Apesar da dramatização, muito do que está na tela realmente aconteceu, o que faz o filme flertar com um drama, uma aventura musical e, em muitos momentos, a comédia. O próprio Marcelo D2 ajudou no argumento e também na trilha sonora. E deve ter ajudado na composição dos personagens também, porque em determinados momentos parece que Renato Goés está literalmente sendo dublado pelo músico, tamanha a similaridade nos trejeitos de voz e entonações. Na verdade, o próprio Ricardo Góes e Ícaro Silva regravaram as canções. Ponto pros atores.
Legalize Já – Amizade Nunca Morre estreia no dia 18 de outubro é uma boa pedida para o cinema. Procure a sala mais próxima. Você vai sair satisfeito e até nostálgico.