O triste fim de House of Cards | Crítica da última temporada
Existem dois tipos de dor. A que te fortalece, e a que é inútil. É com a premissa dada nos primeiros segundos de House of Cards – é a primeira frase dita por Frank Underwood (Kevin Spacey) no primeiro episódio da primeira temporada – que somos jogados ao triste fim de uma das melhores séries dos últimos anos. Melhor porque tinha um grande personagem, interpretado por um grande ator. Tem (tinha) grandes roteiristas, grandes criadores e produtores (Beau Willimon, David Fincher, Joshua Donen e Eric Roth) e, no meio disso tudo, mostrou quão grandiosa é Robin Wright, a nossa Claire Underwood. Ou melhor, Claire Hale. Mas, infelizmente, a dor final que sentimos com o desfecho da série, é a dor inútil.
Ao longo de cinco temporadas – umas ótimas, outras nem tanto – tivemos tempo para ver todo o império construído pelos Underwood. Inicialmente Frank, tempos depois, com Claire roubando de vez a cena. E graças ao crescimento dessa personagem pudemos ter o desfecho de House of Cards. Foi tempo demais para acompanhar o astro Kevin Spacey em suas tramóias, que envolveram quase todos os tipos de corrupções, crimes e intrigas. Não havia limites para a maldade do político. E com essa construção, a produção sofreu um duro golpe quando o próprio Kevin Spacey sepultou sua carreira após as comprovações de seus atos ilícitos da vida real. Acusações de abusos sexuais das mais variadas formas, bullying com a própria equipe de House of Cards e uma lamentável carta de desculpas fez com que ele (assim como alguns outros tipões de Hollywood) fosse jogado ao depósito de descartáveis. E com toda a justiça. Foi assim que ele perdeu sua indicação ao Oscar por Todo o Dinheiro do Mundo, de onde foi sacado por Ridley Scott e em pouco menos de dois meses substituído por um ótimo Cristopher Plummer (que por sinal merecia a estatueta). E foi assim que House of Cards perdeu seu personagem central. Como terminar com sua saga e todas suas lacunas ao longo de todo esse tempo de forma honrosa? Pois é, os desafios foram grandes.
E esses desafios impactaram e muito na qualidade da última temporada, que basicamente precisou passar o pano para muitas subtramas. Elas acabaram aceleradas e resolvidas sem o brilho que teríamos se Spacey usasse o cérebro (na vida real). Com muito louvor tivemos sim uma temporada toda para Claire, que já vinha roubando a cena nas últimas três temporadas. Mas até ela foi prejudicada, já que muitas das melhores partes eram seus diálogos com Francis. Aliás, um fazia escada para o outro. Fora o fato de termos apenas oito episódios, comparados com os tradicionais 13 que vimos ao longo de todas as temporadas. É menos tempo de tela, definições e paciência para construir e destruir as subtramas. Fora o fato que desta vez, nem mesmo os momentos de clímax são algo próximo do que tivemos entre 2013 e 2017.
De pontos positivos, temos algumas meias tramas. O acréscimo de Diane Lane (Liga da Justiça) e Greg Kinnear podem ser saudados, mas acabaram incompletos. Morreram na praia. Principalmente o personagem de Kinnear, que prometeu mais do que cumpriu. Parece que faltaram realmente alguns episódios. Sabe aquele último episódio de novelas onde aceleram ao máximo o passar do tempo? Pois é, mais ou menos isso. Doug Stamper (Michael Kelly) outro destaque da série, mantém seu ritmo de coadjuvante e de personagem transtornado. Seu desfecho foi justificável e plenamente razoável, mas era certeza de que não teria o mesmo rumo caso ainda tivéssemos o presidente Underwood.
A troca de rumos foi o maior golpe que a série poderia ter levado. Um golpe digno de Frank Underwood, diga-se de passagem. Como um todo, House of Cards entregou uma série grandiosa, com viradas e intrigas dignas das melhores séries dos últimos anos. Mas infelizmente, a dor aqui não fez crescer a série em seu momento derradeiro. Dizer que ela é inútil até pode ser forte, mas infelizmente, foi um triste fim para House of Cards. E assim como todas as maldades que se passaram ao longo dos 73 episódios, a culpa é do Frank/Kevin.