Um Dia Qualquer: série retrata uma incômoda realidade | Crítica
Tem série brasileira nova na grade do Canal Space. Um Dia Qualquer, produção feita para ser filme e depois uma série, tal qual feito com O Doutrinador (2018), estreia em agosto (dia 17, às 22 horas) na grade do canal fechado e conta uma história baseada na dura realidade das comunidades de grandes cidades do Brasil. Com um clima que oscila entre Cidade de Deus e Tropa de Elite, mas focado em basicamente duas famílias, a novidade tem direção de Pedro von Krüger, e traz no elenco nomes conhecidos como Augusto Madeira (Bingo – O Rei das Manhãs), Mariana Nunes (O Mecanismo, Amor de Mãe), Jefferson Brasil e Vinícius de Oliveira (Central do Brasil). Ao todo são cinco episódios com pouco mais de 20 minutos – que a Vigília conferiu com exclusividade e já aguarda pela sua continuação! O primeiro episódio já está no YouTube.
A trama foca sem rodeios em um núcleo duro formado por Quirino (Madeira) um atual miliciano do morro, e Penha (Mariana) dona de casa preocupada com o futuro dos filhos. Com um passado nebuloso, somos apresentados a eles no presente, onde uma morte vai acabar colocando suas vidas em um mesmo caminho novamente. Sem entrar em spoilers, esse passado basicamente envolve investigação policial, tráfico de drogas e a “segurança” do bairro onde vivem.
Apesar de serem os principais condutores de “Um Dia Qualquer”, Quirino e Penha são cercados por personagens que contornam de forma expressiva todo o contexto que vai se desenrolando. Um deles é Beto (Willean Reis) filho do miliciano, que é de certa forma obrigado pelo pai a estudar e se tornar um bom advogado, e outra é Bruna (Tainá Medina) sua nova esposa, que provocativamente regula de idade com Beto. Além deles, temos ainda Maciel (Vinícius de Oliveira) colega de “fluxo” de Quirino, e Seu Chapa (Jefferson Brasil), um traficante do morro, mas não necessariamente um vilão.
A partir do primeiro episódio, várias sementes ficam plantadas na trama e os flashbacks vão nos ajudar capítulo a capítulo a entender como tudo chegou ao momento crítico da atualidade. Infelizmente, a história de Um Dia Qualquer é facilmente reconhecida como factível. É a história de vários subúrbios brasileiros. Conforme Kruger, é exatamente essa ferida que a produção quer tocar. Em coletiva, ele sentenciou. “Queremos sim gerar uma discussão, temos essa ideia de ativismo. Nós gravamos há algum tempo atrás, mas é hoje que se discute escritório do crime e seus impactos em todo o Brasil”. A relação que ele faz é direta com o personagem Quirino, que de policial, passa a miliciano com o confuso senso de que está fazendo justiça.
É na força dos personagens Quirino e de Penha que vemos os principais conflitos. Augusto Madeira, rosto conhecido da comédia, encarna um papel violento. É um vilão cansado que está há 10 anos tentando “trazer paz” ao bairro. Embora você possa surpreender, não é a primeira vez que ele faz um papel pesado (vale assistir Hora do Perigo, disponível na Netflix). Já Penha é a mãe que está agindo a partir do emocional. Mas nem mesmo a igreja, tábua em que ela se agarrou nos últimos anos, poderá ser sua verdadeira salvação. Mais um forte paralelo da realidade do Brasil.
Mesmo chegando diretamente na TV fechada, Um Dia Qualquer ainda ganhará as telonas em um futuro próximo. Como longa, a produção já garantiu espaço no Festival de Buenos Aires e de Madrid, além do Festival de Nova York. Isso tudo deixa no ar um pouco mais de curiosidade pela produção e os diferenciais que ela pode trazer. Como série de TV, funciona muito bem e deixa o espectador salivando por uma segunda temporada. Mas para isso, teremos que contar com a superação da pandemia, o que no Brasil, está longe de acontecer.