Mais pesado é o céu traz crueza e sofrimento para o Festival de Gramado
Mantendo sua tradição de apresentar obras com diferentes pontos de vista e gêneros, o 51º Festival de Cinema de Gramado foi o palco da estreia de “Mais Pesado é o Céu”. O longa do cearense Petrus Cariry reúne Matheus Nachtergaele (Cabras da Peste, O Clube dos Anjos) e Ana Luiza Rios como os errantes Antônio e Teresa. Vindo de diferentes direções, eles guiaram a narrativa depois do Festival ter apresentado uma biografia com Ângela, e um drama com doses de humor com Tia Virgínia. Portanto, esse foi o filme mais pesado até aqui. No semiárido do interior do Ceará, na cidade inundada de Jaguaribara, veremos uma jornada de dor e sofrimento.
A cidade inundada, que por sinal foi tema do primeiro longa documental do festival desse ano, não faz parte da ficção. Ela realmente foi um local próspero que foi submerso em nome do “desenvolvimento” do Ceará. As tragédias já começam por aí. Mas Jaguaribara é um contexto que reflete a conexão dos personagens centrais. Um passado em comum.
Já os protagonistas vêm de direções opostas e parecem ter planos distintos. Mas este é um mistério que vai se desenvolver. Antônio está vindo de São Paulo, onde os sonhos de ganhar a vida na cidade grande não deram certo. Agora a meta é caçar caranguejos junto com um amigo que parece estar prosperando. Já Teresa quer deixar o interior e tudo que ele representa para ela. O filme que começa com tons solares vai perdendo sua cor. Não exatamente em seu clima ou fotografia, mas nas dificuldades que vão aparecer. O encontro deles se dá logo após Teresa encontrar um bebê em um barco. O menino é um dos primeiros mistérios que “Mais Pesado é o Céu” nos apresenta.
O filme então passa a oscilar cenas na cidade deserto. Para além da cidade como personagem, ainda temos a rodovia 116 que corta o Brasil como uma nova coadjuvante. O primeiro contato não nos entrega, mas logo estaremos angustiados com a família formada pelos três (seria o destino?). Isso porque a partir da falta de objetivos e perspectivas, todos estão com fome. Sobretudo o bebê “encontrado” no barco. Orbita esse contexto de dois errantes sem um lar em uma busca nada concreta por uma nova vida uma dica dada pelo rádio: há um assassino matando pessoas nessa mesma rodovia.
Petrus Cariry apresenta bons planos, faz bom uso dos cenários incríveis de Jaguaribara e entrega uma direção correta de seu elenco, que ainda conta com Silva Buarque como uma quase tábua de salvação para Antônio e Teresa, além de Danny Barbosa como a atendente Letícia. Cariry quase nos dá esperança que as coisas podem mudar para os dois nômades, mas mesmo com pequenas evoluções, a falta de perspectiva e a fome são itens marcantes. E para pessoas nessas condições, tentar viver é na verdade sobreviver.
Com muita angústia, sofrimento e crueza, “Mais Pesado é o Céu” acaba perdendo alguns pontos por manter a algumas repetições de cenas (às vezes menos é mais). Já a intensidade de sofrimento que seus personagens é uma jornada angustiante para o público. Por outro lado, seu clímax, assim como sua apresentação, deixa as situações mais abertas, jogando para o público julgar algumas ações e possibilidades, deixando a obviedade de lado.