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Estômago 2: repetição da fórmula com tempero italiano

Seguindo a competição de longas do 52º Festival de Cinema de Gramado, o alecrim dá espaço para a flor de jambu. Estômago 2, do diretor Marcos Jorge, repete sua fórmula de uma maneira mais pesada e violenta.

Em Estômago, de 2007, acompanhamos a trajetória de Raimundo Nonato (João Miguel) que saiu da sua terra natal para encontrar mais oportunidades. Contudo, seu destino é a prisão e, para sobreviver, ele faz o que sabe fazer de melhor: comida. Após 15 anos, ele segue cozinhando. Agora, faz as marmitas dos agentes penitenciários e da alta cúpula da prisão. Além de, claro, trabalhar como infiltrado – levando informações do diretor para Etecetera (Paulo Miklos) e vice-versa.

Para apimentar as coisas, um grupo italiano mafioso chega ao local. E aí a história se torna muito mais italiana e violenta que a comédia que tínhamos memória. Quando subiu ao palco, Marcos Jorge pediu para evitar o inevitável: comparar o sucesso Estômago com o novo filme que ele estava lançando.

O primeiro longa trouxe uma fórmula inovadora, que apresentava a montagem como elemento central da narrativa. Já neste, essa é a característica que sobrevive. Raimundo Nonato, ou Alecrim, se torna um mero coadjuvante de luxo da sua própria história. Um personagem que permeia, sem saber qual time ficar, e é ofuscado por uma história de máfia italiana. Podemos entender a lógica da comida italiana nesse segundo filme: é numa cantina que Nonato aprende os macetes da cozinha e é numa adega cheia de vinhos importados que ele consegue seu passe para a cadeia. Mas um novo personagem principal torna a história menos daquilo que gostaríamos de ver.

Violência entra, Raimundo sai

Apesar de começar com belas imagens de cozinha, o filme perde seu foco, de nos ganhar pelo estômago. A violência, o mundo do crime e das drogas, além das estratégias de sucessão que envolvem a vida de Roberto (Nicola Siri) protagonizam a história. O filme é quase um longa italiano. Tem paisagens italianas, atores italianos, problemas italianos, o idioma, inclusive, é italiano. A prisão no Brasil serve apenas para linkar tudo. E não parece o suficiente para quem já é fã da trama e dos personagens iniciais. Falta a brasilidade que cria conexão com o espectador.

Mais interação dessa dupla faz falta em Estômago 2

Muito mais italiano que brasileiro, o filme serve como produto fechado de entretenimento. São quase duas horas que ficamos presos à tela. Contudo, a história pregressa se perde nesse emaranhado de casos de família. Apesar do diretor Marcos Jorge pedir, encarecidamente, que não fizéssemos comparação de um filme com o outro, isso se torna inevitável. Com a alcunha de “2”, o filme dá a entender que é uma continuação, mas serviria melhor como um filme derivado daquele universo.

A violência ganhar tanto espaço nessa trama que realmente incomoda. Estômago tinha um grande mérito por trazer um personagem quase inocente para o mundo da criminalidade. Raimundo Nonato criava empatia com o público, algo que Roberto não consegue fazer de forma nenhuma. Dessa vez, o protagonista não é um brasileiro que só quer sobreviver. É um italiano que vive de teatro, mas troca rapidamente para a cozinha e se torna um chef. Casa e descasa. Entra no crime por amor, mas também por ganância, diferente do que Raimundo faria.

Quando centrado na prisão e na comida, o filme era divertido e leve. Agora ganha os contornos violentos que apenas a máfia italiana pode oferecer. E essa escala de criminalidade vai ganhando mais espaço e atingindo outros personagens que não imaginávamos. E essa não é uma crítica puritana. Acredito que a violência em escala menor era uma grande virtude do primeiro filme. Afinal, Marcos Jorge conseguiu fazer um filme que se passa dentro de uma penitenciária de forma leve, divertida e com o personagem principal extremamente carismático. Não temos nenhuma dessas coisas agora.

Estômago foi um sucesso estrondoso. Estômago 2 pode levar as pessoas ao cinema pela nostalgia, vai entreter, mas vai deixar um amargo gosto de frustração. Entretém, mas aquém do primeiro. Queríamos mais Raimundo Nonato em tela. Funcionaria melhor se fosse uma obra fechada ou algum derivado, talvez até mesmo como um telefilme. Tecnicamente, o filme é excelente. Tem uma produção pomposa, bons personagens, um formato interessante. Mas não é Estômago.

Veredito da Vigilia

Foto: Edison Vara/Agência Pressphoto

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