Divórcio | Crítica
Comédia dirigida por Pedro Amorim é a estreia brasileira no dia 21 de setembro
Crítica por Maytê Ramos Pires
Um filme leve e bobinho, mas que garante boas risadas. O objetivo era fazer uma comédia, não era? Então foi bem entregue: desperta risos (às vezes, embaraçosos) na maioria dos momentos. Tal como o título define, esta é uma produção sobre divórcio. O divertido é buscar nos estereótipos para divertir pelos padrões estabelecidos de que a mulher quer criar a imagem de indefesa para ganhar pensão e que o marido quer se colocar como o responsável mantenedor da família, que até o momento era casado com uma histérica. Apesar dos problemas que os apelos na criação dos tipos poderiam ocasionar (e que levam a desconfortos, sim), vemos o descrédito dessa rotulação nos próprios personagens, brincando com os preconceitos.
A trama conta a história de um casal que se une e aposta em si mesmo contra a vontade da família. Júlio (Murilo Benício) é um carioca encrenqueiro e Noeli (Camila Morgado) uma moça abastada e um tanto deslumbrada. A união deles começou com alvoroço, passando por uma fase de adaptação e aposta na criação de uma marca, que viria a ser o ganha-pão da família: um molho de tomate enlatado. O molho começa da receita de Noeli (Camila), mas rapidamente os negócios passam a ser inteiramente administrados por Júlio (Murilo) e ela vira uma socialite. Os dois têm duas filhas, mas o amor que demonstram mesmo é aos sapatos e carros. O desgaste da relação veio naturalmente, com os anos de matrimônio, como é comum em qualquer relação, o detalhe determinante é a falta de maturidade deles em lidar com isso, o que levou ao processo de divórcio.
Com cada um querendo deixar o outro na pior, esse divórcio só poderia configurar um desastre, com direito a ameaças armadas e fogo, tudo excessivamente dramático e grotesco. O humor aqui é de comédia-pastelão mesmo, com gracinhas fáceis como cabelos despenteados, danos a carros, pseudo perseguições e ridicularização de determinada característica comportamental. Não há esforço em construir camadas e personagens complexos. Há apelo pela caricatura de si. Os personagens principais são estrelados pelos excelentes Murilo Benício e Camila Morgado, mas pouco vemos da capacidade deles visto que estão escondidos em papéis que forçam demais o riso a partir de seus trejeitos exagerados. Aliás, eles se situam negativamente por se alternarem demais, não tendo uma unidade de atuação para além de um elemento básico em cada um – o do Murilo tem uma risada similar ao barulho de um carro enguiçado e a da Camila é atrapalhada e vive tropeçando/caindo.
Nisso a mensagem do filme quase se perde, mas com empenho conseguimos perceber a metáfora de amor e perseverança. A temática do divórcio acaba sendo uma máscara para pensar de fato na atenção que damos ao construir nossas relações. O cuidado com o que criamos é importante para problematizar o porquê da linha tênue entre amor e ódio, visto que pode ser que não se tivesse certeza de determinadas escolhas e talvez não tenha havido vontade para enfrentar as dificuldades. Também, que relacionamento não se mantém apenas com amor mútuo, a vivência diária requer engajamento e luta para seguir valendo a pena. É uma temática vital, trata da base das relações humanas, mas com uma reflexão superficial e que pode passar desapercebida por alguns espectadores pelo caráter de humor construído.
Vale destacar que o ciclo da narrativa se completa e no final nos reconectamos ao início, tornando o desenrolar previsível, mas interessante, principalmente em relação ao jogo de câmeras e enquadramentos nos carros apressados. Aqui temos as melhores escolhas dessa produção que, apesar de ter claras inspirações em obras anteriores (e que foram melhor concretizadas), ganha no bom uso de cores e num eficaz jogo de câmeras.
Vale mencionar, ainda, em um respiro de final de texto, o papel da cidade na narrativa. O enredo se passa em Ribeirão Preto e pouco vemos da cidade, vemos mais as plantações do que qualquer outra coisa. O que vemos são os comentários na relação entre interior e capital e os gracejos desse confronto, seja de sotaques, recursos ou aparências.