A Primeira Morte de Joana toca em tabus e autoconhecimento
Mostrando sua pluralidade de gêneros, o 49º Festival de Cinema de Gramado apresentou no dia 17 de agosto, o longa A Primeira Morte de Joana, da diretora Cristiane Oliveira (Mulher do Pai). O filme que representou o Rio Grande do Sul na Mostra Competitiva de Longas Nacionais trouxe uma história toda feminina, de autoconhecimento e de legado. Não a toa, toda equipe envolvida na produção é composta por mulheres, trazendo um olhar muito único para uma história que só elas poderiam contar. O famoso lugar de fala.
Na trama acompanhamos Joana (Letícia Kacperski), uma menina de 13 anos que, após a morte da tia-avó, aos 70 anos, quer descobrir de todas as maneiras o porquê ela nunca ter namorado alguém. O fato que chega ao roteiro foi uma menção real da diretora, que teve uma familiar nessa situação. Como a própria Cristiane Oliveira comentou entre os painéis do Festival, isso sempre a deixou muito curiosa e instigada. E claro, no contexto do filme, essa noção de mistério ganha novos ares, como segredos que quase toda a família de Joana esconde, pelo clássico fato de que ela precisa ‘manter as aparências’ em uma cidade do interior do Rio Grande do Sul. Ao mesmo tempo que temos a essência provinciana, um olhar mais evoluído aparece com a chegada da instalação de um parque eólico na cidade, que se costura também com a presença da família de Carolina (Isabela Bressane), a melhor amiga de Joana.
Cristiane coloca em xeque os valores e o status quo da “família tradicional brasileira” em uma história juvenil e por vezes inocente. Joana ainda é uma pré-adolescente cheia de dúvidas e dando seus primeiros passos em direção a sexualidade. Seus pais são separados e sua mãe Lara (Joana Vieira) carrega o “fardo” de manter tais aparências. Mas ela também vai esconder seu novo relacionamento, que ainda se mistura com religião, da própria filha. Desde sempre, Joana precisa fazer suas próprias investigações, afinal, quase ninguém fala com ela sem esbarrar em algum pudor ou barreira social, que tradicionalmente são apenas preguiça ou puro preconceito.
Os recortes de Joana e seu início de relacionamento com Carolina vão colocando a jovem em uma jornada de amadurecimento. Ao mesmo tempo, a diretora não tem pressa, e vai intercalando a trama central (e as secundárias) com takes do interior do Rio Grande do Sul, sobretudo Osório, onde temos os cataventos gigantes que terão uma participação importante na construção da tensão nas cenas finais entre Joana e Carolina. Um belo recurso visual.
A Primeira Morte de Joana tem (teve) uma história importante também em outros festivais. Sua première mundial foi no 51º International Film Festival of India. O filme também já ganhou o circuito nacional da França, onde teve boa receptividade da crítica. E com certeza terá em Gramado novos ares e novos alcances. A Primeira Morte de Joana é uma crítica eficaz e uma mensagem importante para o Brasil e para o mundo que parece gostar de ser intolerante hoje em dia. Afinal, é na visão das mulheres que vamos encontrar o caminho para que certos tabus e “provincianismos” sejam finalmente quebrados.