Kurt Cobain: Montage of Heck | Crítica
Há mais de 20 anos (sim, eu também fiquei chocado com a distância temporal), Kurt Cobain e o Nirvana viravam uma página especial da história do rock mundial. De lá pra cá, o líder da banda entrou para o seleto hall dos ídolos imortalizados por tragédias e a fatídica lei dos 27, que levou ícones como Jimi Hendrix, Jim Morrison, Janis Joplin e mais recentemente Amy Winehouse, todos aos 27 anos. De lá pra cá, também vieram homenagens e documentários tentando elucidar, ou até recriar, seus últimos momentos. A vida de Kurt foi embora em abril de 1994. Ficou o legado.
E uma nova visão da história foi recontada em Cobain: Montage of Heck, do diretor Brett Morgen. A produção entrou no catálogo da Netflix no dia 2 de fevereiro. Desde os seus primeiros dias, a ascensão da banda, os vídeos inéditos e íntimos, até a queda e a despedida. Está tudo lá. Dentro disso, também muitos manuscritos, cartas, partes das letras dos clássicos do Nirvana, além de um desenho e montagens que parecem sair diretamente da mente de Kurt.
Após assistir aos 145 minutos de vídeo, a sensação é incômoda. Aquela mexida no estômago que vem depois de se perceber que as pistas estavam todas lá, eram claras, e mesmo assim, a perda não pôde ser evitada. A narrativa ganha peso não muito pelas entrevistas, mas sim pelos vídeos de Kurt e a companheira Courtney Love. O sucesso, as preocupações, comparações e diálogos mostram um pouco da loucura que era viver no núcleo da banda de rock mais representativa dos anos 90. Mostram também particularidades para lá de íntimas, principalmente após conturbado nascimento da filha Frances Bean Cobain, a qual alegava-se que já nascera viciada (era o que alguns jornais diziam). Por mais sorte que juízo, a garota ultrapassou o obstáculo e o risco que era ficar com os pais convalescentes pelo abuso (e põe abuso nisso) de drogas como a heroína. Aliás, nos vídeos íntimos é difícil perceber algum momento em que a dupla Kurt e Courtney estivessem sóbrios. Mesmo com a bebê no colo, o que nos lembra um pouco do filme Trainspotting.
Sempre misturando as músicas com montagens e as anotações de Kurt, percebemos que o brilhante artista estava, desde criança, buscando a atenção e suprir um certo tipo de carência e lutando com alguma hiperatividade acima da média. Ele quis ser o pai e criar a família que não teve, afinal, ele era despachado pelo pai e pela mãe como um objeto. Ao mesmo tempo, ele desdenhava do muitas vezes supérfluo mundo do showbizz, ainda que possamos perceber alguma incidência de ciúmes claros contra o Guns N’ Roses (risos). No final das contas, chegamos na nostalgia, e na cumplicidade que temos com os ídolos que nos deixam cedo. Quando saem os homens e criam-se as lendas. A Vigília Recomenda.
Atente ainda às raridades mescladas na narrativa. Impossível não assistir e puxar aquele CD antigo da estante. Ou, mesmo digitar NIRVANA lá no Spotify.